Sofri um Acidente no Percurso para o Trabalho. Tenho Direito a Estabilidade?

01/10/2022

Se você for empregado e sofrer um acidente indo ou voltando do trabalho, no caminho que sempre faz, isso será considerado acidente de trajeto ou de percurso. Se, por causa desse acidente, ficar afastado por mais de 15 dias, não poderá ser demitido antes de 1 ano depois que terminar seu afastamento.

Caso seja demitido, a demissão será ilegal e você terá o direito de entrar na justiça para pedir que a justiça obrigue a empresa a te dar o mesmo emprego de volta, além de pagar os salários que você não recebeu da demissão até a data em que conseguir seu emprego de volta.

E não acaba ai, se a empresa não quiser te dar o emprego de volta, ou se isso não for mais possível, você terá o direito de receber os salários da data da demissão até 1 ano após o fim do seu afastamento, mesmo sem trabalhar.

Ah Dr., sei não hein. A empresa não emitiu a CAT, e eu nem mesmo recebi auxílio doença acidentário no INSS. Será que tenho direito mesmo assim?

Como advogado trabalhista há mais de 12 anos eu posso te dizer que já vi muito isso acontecer e sim, você tem direito.

O que vai importar, nesse tipo de processo, é provar que você sofreu um acidente indo para o trabalho ou voltando dele e que ficou mais de 15 dias sem poder trabalhar, com atestado médico.

Por mais que tentem te convencer do contrário, tenha em mente que o acidente de trajeto é sim considerado acidente de trabalho, e vai gerar direitos para o trabalhador acidentado no trajeto casa/trabalho ou trabalho/casa.

O que diz a Lei

A Lei que regulamenta esse assunto é a Lei de Benefícios da Previdência Social, Lei nº 8.213/91, a qual diz, no artigo 21, IV, letra d, que se equipara a acidente de trabalho o acidente sofrido pelo segurado, ainda que fora do local e horário de trabalho, no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.

A mesma lei ainda fala, no artigo 118, que o segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário.

Qual o Entendimento da Justiça do Trabalho Sobre Estabilidade por Acidente de Trajeto

Por causa da exigência prevista na parte final do art. 118 citado acima, o Tribunal Superior do Trabalho - TST, passou a decidir que, para ter direito a estabilidade, o trabalhador deveria receber o Auxílio-Doença Acidentário pelo INSS, código B91.

De tanto decidir nesse mesmo sentido, foi editada a Súmula 378 do TST, que fala assim no item II:

São pressupostos para a concessão da estabilidade, o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.

Acontece que muitas vezes não é emitida a Comunicação de Acidente de Trabalho - CAT, e o acidente também não é enquadrado como sendo de percurso, pelo INSS, de forma que o trabalhador que sofreu um acidente no caminho casa/trabalho ou trabalho/casa, ficou mais de 15 dias afastado, mas recebeu apenas o auxílio-doença comum, B31, não teria, pelo que foi dito acima, o direito a estabilidade por acidente de trajeto.

Uma situação muito injusta, porque foge da essência da lei, que é a proteção do trabalhador em uma situação de vulnerabilidade, e ainda coloca no trabalhador a responsabilidade por erros que não cometeu.

Na verdade, você sofre um acidente de percurso, a empresa não emite a CAT, você não recebe o benefício correto, e a empresa ainda é premiada por não ter feito o que deveria, possuindo, em tese, o direito de te demitir antes de vencido o prazo de 1 ano.

Uma exigência que beira ao absurdo e que, para ser cumprida, obrigava o trabalhador a entrar na justiça contra o INSS, para reenquadrar o benefício de auxílio-doença comum para auxílio-doença acidentário, implicando em dispêndio de dinheiro e de tempo.

Ainda bem que o bom senso reinou e atualmente a situação foi simplificada. O entendimento que prevalece na justiça do trabalho, inclusive no Tribunal Superior do Trabalho, é o de que o fundamento da estabilidade por acidente de trajeto/percurso é o acidente de trabalho em si e a incapacidade superior a 15 dias, e não o gozo do benefício previdenciário.

Veja, a respeito, a seguinte decisão:

AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/17. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE PERCEPÇÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. SÚMULA N.º 378, II, DO TST. Do contexto fático delineado pelo Tribunal Regional , verifica-se que foram comprovados o acidente de trabalho, a culpa da ré, bem como o afastamento do autor, por meio de sucessivos atestados, por mais de quinze dias. Nesse contexto, o simples fato de o empregado não ter gozado do benefício de auxílio-doença acidentário não é suficiente para afastar a estabilidade provisória acidentária, pois o fundamento da estabilidade é o acidente de trabalho, e não o gozo de auxílio-doença. Inteligência da Súmula n.º 378, II, do TST. Precedentes. Agravo a que se nega provimento. (grifos nossos)

(TST - Ag: 5190320165200011, Relator: Amaury Rodrigues Pinto Junior, Data de Julgamento: 30/03/2022, 1ª Turma, Data de Publicação: 01/04/2022)

No mesmo sentido é o entendimento da 4ª Turma do TST:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA (SBF COMÉRCIO DE PRODUTOS ESPORTIVOS LTDA.). ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. ACIDENTE DE TRABALHO RECONHECIDO EM JUÍZO. AUSÊNCIA DE RECEBIMENTO DE AUXÍLIO DOENÇA ACIDENTÁRIO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA DEVIDA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. O Tribunal Regional reformou a decisão de origem, para condenar a Reclamada ao pagamento da indenização substitutiva da estabilidade provisória no emprego, declarando nula a dispensa imotivada, sob o fundamento de que "o fato de o INSS ter concedido auxílio-doença comum, e não na modalidade ' acidentário', não retira do obreiro o direito à estabilidade, nos casos em que resta provado, a posteriori, a ocorrência de acidente de trabalho". Consignou que "restou incontroverso nos autos a ocorrência de acidente de trabalho, bem como de afastamento da recorrida por período superior a 15 (quinze) dias em decorrência do infortúnio". II. Neste Tribunal Superior é pacífico o entendimento de que o não recebimento do auxílio doença acidentário não é suficiente para afastar a estabilidade acidentária de que trata o art. 118 da Lei nº 8.213/1991. Isso porque o fundamento da estabilidade acidentária não é a percepção do auxílio-doença acidentário, e sim a constatação de que o empregado sofreu acidente do trabalho em circunstância que o faria credor desse benefício, o que ocorreu no caso dos autos. III. A decisão regional está em harmonia com a iterativa, notória e atual jurisprudência desta Corte Superior sobre a matéria, razão pela qual é inviável o processamento do recurso de revista, nos termos dos arts. 896, § 7º, da CLT e 932, III, do CPC/2015 e da Súmula nº 333 do TST. IV. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento. (grifos nossos)

(TST - AIRR: 10258820155070006, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 18/09/2019, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/09/2019)

Você precisa fixar em sua mente, portanto, que, se sofrer um acidente no caminho casa/trabalho ou trabalho/casa, por qualquer meio (veículo da empresa, veículo próprio, a pé, ônibus, bicicleta, etc), e ficar de atestado mais de 15 dias, terá o direito a estabilidade no emprego, pelo período de 1 ano, independente do que te disserem, pois esse é um direito do trabalhador acidentado de percurso em 2022.

Como funciona na prática

Você estava indo ou voltando do trabalho, sofreu um acidente, machucou, e teve que ficar mais de 15 dias de atestado. A empresa pagou os 15 primeiros dias e te encaminhou para o INSS. No INSS você recebeu o benefício previdenciário comum - B31.

Assim que venceu o período do seu afastamento, você voltou para trabalhar e o que encontrou? Rua, claro! Passou direto para o RH.

Até tentou argumentar que leu um artigo de um advogado que falava que não poderia ser demitido, mas não te deram ouvidos, e concluíram a demissão assim mesmo.

Então você contratou um advogado de sua confiança e entrou com processo na justiça. Em defesa, a empresa alegou que você não tinha direito porque não provou que o acidente foi de trabalho e porque não recebeu o Auxílio-Doença Acidentário.

Com base nos documentos do dia do acidente, no seu comprovante de endereço e no endereço da empresa, o juiz concluiu que o acidente foi no percurso casa/trabalho, ou seja, considerou o acidente como sendo de trajeto.

Avaliou também os atestados médicos e concluiu que você precisou ficar mais de 15 dias sem trabalhar, mesmo não tendo recebido o Auxílio-Doença Acidentário.

Assim, te deu ganho de causa, determinando que a empresa pagasse os salários devidos da sua demissão até o período de 1 ano após o fim do seu afastamento do trabalho.

A empresa recorreu para o Tribunal Regional do Trabalho, perdeu. Recorreu para o Tribunal Superior do Trabalho e perdeu também.

Não teve outra alternativa, foi obrigada a pagar.

A justiça foi feita, como teria que ser.

É assim que funciona na justiça: você tem seu direito violado, entra com o processo, prova que sofreu um acidente de trajeto ou de percurso casa/trabalho ou trabalho/casa, prova que ficou mais de 15 dias afastado do trabalho em razão do acidente sofrido e nada do que a empresa alegar importará, você terá direito a estabilidade.

Pedido Especial para Você

Minha intenção é informar você da melhor maneira possível sobre os seus direitos. E só tem uma forma de saber se estou conseguindo fazer isso como gostaria, ouvindo sua opinião. Por isso, se você chegou até aqui, se leu o texto, se esse post ajudou a esclarecer sua dúvida ou resolver seu problema, por favor, deixe seu comentário! Saber que foi importante para você me motivará a ajudá-lo cada vez mais!

Até a próxima!

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